31/01/12

Sequência poética 11

As Lágrimas do Pássaro de Fogo
À beira de um lago de águas calmas,
Águas e frias da montanha,
Negras como o negro da sua plumagem
Quando vista à luz da lua e das estrelas,
Chorava um pássaro de fogo,
Doce e suave, a cabeça nas sombras pendendo,
Pelo bico escorrendo gotas de prata pura.
Magnificamente chorava o belo bicho,
As penas brilhantes das asas cansadas roçando
A água escura do frio lago cinzento e triste,
Triste pelo esplendor que lhe conferia a luz
De prateado círculo e que, de dia
Lhe tirava o Sol faiscante.
E porque chorava o fogoso pássaro?
Chorava por nada, chorava por tudo,
Chorava pelo que via,
Chorava pela beleza desaparecida
Dos dias passados e daquilo que já não via.
O pássaro de fogo chorava pela Natura,
Chorava pelas florestas ancestrais,
O refúgio de quanto restava de grande pureza,
Chorava pelos lagos azuis, negros e verdes,
Pelo luar que de prateado os tingia,
Pela solidão da Natureza intocada,
Agora triste, silenciosa e refugiada
Nas próprias profundezas melancólicas.
Chorava ainda pela cegueira
Daqueles que o mundo dominavam
E que sobre a Natura descia furiosamente,
Como um Inverno que veio para ficar,
Que faz os rios murmurar e chorar
E que de branco as montanhas vem coroar
Com uma coroa de espinhos
Que ninguém lhes poderá tirar.
Oh! Que cegueira era aquela tal!
Era uma cegueira fria e insensível
Que arrasava mais que a vermelha lava
Que era a manifestação furiosa
Do poder soberbo e superior da Mãe Natureza.
Era uma cegueira de horrorizar,
E o pássaro negro por causa dela chorava,
Que derrotava o equilíbrio deste mágico
Mundo sob o firmamento plantado.
O pássaro de fogo chorava pelos homens,
Pois quando os cegos o próprio arrimo destroem
Sempre acabam por cair.
Só que a humana cegueira
À queda levaria o mundo inteiro,
Como uma âncora impiedosa
Que para o fundo do mar leva o navio.
Ai! Pobre fauna mutilada,
Pobre flora golpeada por machado
Tão cobarde que misericórdia não teve,
Pois deixou a presa em agonia
Para o chão verde sangrando verde sangue.
Oh! Como o golpe doeu às árvores!
Pois que Inverno é este
Que gela os bosques até às veias
A seiva nos ramos congelando,
Das árvores desalojando
As formosas dríades dançantes
E das flores expulsando duendes e abelhas
E das suas tocas enxotando
Os saltitantes trasgos vivazes.
Ao lago traz melancolia,
Sobre as águas lançando eterno gelo,
Adormecendo o seu espírito murmurante.
Por tudo isto chorava o pássaro de fogo,
Debaixo da luz da lua,
No frio eterno do seu Inverno.
Deixem-me chorar com ele,
Chorar a Natureza,
A sua doce beleza
Que aliada é da imaginação!



Sem Sentido
Às voltas, perdido, anda o Universo
E com ele o seu significado disperso.
Que faço eu aqui,
Se o caminho do futuro não segui?
Estou na estrada do passado
A viver um sonho, acordado.
Mas a cada passo do destino
Mais me afasto dela e desatino.
Que resta no futuro
Para os ecos da lembrança?
Resta a doce esperança
De não sofrer o esquecimento duro.
Mas se, no fim, malograda
For a minha confiança,
Não me virá mais bonança
Na tempestade da noite inacabada.
Sigo com o esquife para a frente,
Pelo desgosto da noite dolente…
Sentido aqui não há
Para o que passou e não voltará.


Entardecer
Cai o sol em batalha no Poente,
Apodera-se da terra o sono dormente,
A clara escuridão que dos céus desce
Toma conta do coração, que adormece.
Já nada brilha ou ilumina o espírito
Que, envolto em sombras, escurece
E fica da cor do negrume
Que o tempo arrefece.
O nascimento já vai longe,
A vida do dia passou a correr…
Anoitece já e prepara-se a velhice
De um dia que acaba.
Mas será o seguinte um começo?
Acaba a luz na noite,
Acaba o dia, para o bem ou para o mal,
E vai-se o tempo sem igual.
Amanhecerá?



Sou Náufrago no Mar dos Sonhos
Navego, sem rota, entre os astros do céu,
Rodeado das maravilhas deslumbrantes
Que, na sua gentil bondade, o Universo concebeu.
Vejo as caudas dos pesadelos sombrios,
Como se de cometas disfarçados,
Escondendo-se com o nascer de dias fugidios
E voltando à noite, quando esta vai alta
E tudo de trevas é feito e revestido.
Mas – alegria! – a escuridão é quebrada:
Vejo a luz, que dilacera o coração das sombras;
Vejo as brancas nuvens e as terras
Da felicidade eterna, que residem
Além de Saturno e outros gigantes;
Tudo brilha e resplandece em meu redor,
Vem do infinito um vento de contentamento
Que em seus braços me toma a alma,
Sem que seja pelo corpo aprisionada;
Luzente e branca de neve é a alegria,
Sem cor o sono calmo e benfazejo,
Mas dele vem o sonho que alumia
O lugar distante e belo que almejo.
Mas não será tudo isto vão,
Como me diz este ou aquele sábio,
Visto que o tempo apressado
Corre e se afunda em negridão?
Verei então poema e romance,
Recordação e sonho
Com os olhos da vida
E o alcance da verdadeira visão.
Assim tenho de proceder,
Pois não sei quanto deixei para trás
Por escrever – rabiscar! –

Em vez de olhar.
Tomás Vicente (ex-aluno)

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