13/01/12

Sequência poética 9

Os Cruéis Bardos
Que mundo este,
Onde uma grande vitória
Passa quase ao lado da memória,
Enquanto uma pequena derrota,
Tão discreta como um arrastar de pés,
Logo cai na longa língua da escória.
Ai, que sorte a minha:
Não tenho quem minhas conquistas
Celebre em altos brandos,
Em suave apoio silencio,
Num mudo andar circunspecto;
Não me faltam, ainda assim,

Bardos que me cantem as derrotas.


Noitibó
Voas pelos céus da Noite,
Instilando lucidez ou medo demente
Da escuridão e dos seus perigos,
Conforme te der mais prazer,
Nos corações que dormem
E nos que, dormindo,
Não dormem.
No meu instilas, sobretudo, consciência,
Pois vens com a noite, suavemente tenebrosa,
Que arrependimento me prediz
Pelas maldades que fiz.
No entanto – posso dizê-lo sem vergonha –
Também um pouco de medo,
Medo dos fantasmas da culpa.
Caminhas pelos ares da treva
Como peregrino em estrada santa,
Trazendo o peito cheio
De serena confiança.
Voarás esta noite, uma vez mais,
Para me assolar o sono tormentoso.
Não te impeço, deixo-te a janela aberta.
Pela manhã desaparecerás
Para te esconderes da cara do Sol.
No crepúsculo tornarás
A visitar esta e outras casas
Até que o tempo te corte as asas.


O Homem Fugindo do Sol
Há muito tempo houve uma época
Em que o Sol para nós não brilhava,
Em que o Homem se entregava
A negros e obscuros pensamentos
Que a tormentos o não poupavam,
Pois muitas víboras no mesmo ninho
Sempre acabam por se morder.
Assim acontecia com o Homem,
Que a virtude tinha perdido
Nos seus dias primordiais.
E grande foi o seu alívio
Quando as demoníacas sombras
Dos corações humanos foram expulsas.
Só que a sua cegueira rasto deixou
E o Homem Purificado temeroso ficou
Tanto da treva como da luz,
Pois se o Demo nas sombras se acoitava,
Que guardaria para eles o sol,
Radioso globo em chamas poderoso?
Mas sobre a Terra ou há luz e Dia
Ou dominam as trevas da Noite.
Por isso o Homem amedrontado,
Sem debaixo do Sol poder descansar,
À terra se rendeu e nos seus túneis se perdeu.
Oh! Nos túneis da escuridão
Se deixou o fraco Humano prender,
Pois entre paredes de terra apertado estará
Sempre quem debaixo do céu não puder viver!


Coração Pulsante
Não há nenhum frio humano,
Que seja como a negra e triste pedra,
Que seja tão insano
Ao ponto de não sentir.
No entanto, lá longe vejo vir
Quem diz que dentro de mim
Nada há que seja compaixão
Por outro coração;
Dizem-me que sou como os anacoretas
E quando passo só vejo caretas:
Sussurram que no meu mundo
Não cabe a preocupação pelo dos outros;
Vêem o casulo,
Não vêem a crisálida,
Sentem do norte o vento frio,
Não sentem na face a brisa cálida;
Mas não percebem nem sabem
Que esse bafo caloroso floresce,
Só vêem o casulo, que também cresce,
Como a negra capa
Que o brilhante aço tapa;
Dizem que não sinto amor
Nem a dádiva da amizade,
Que não vejo dos dias a verdadeira cor
Nem entendo dos dias de felicidade
Ou da vida a bondade;
Não vêem o sofrimento –
Nem o tentam aliviar -,
O sofrimento pelo que sinto
E sobre o qual todos dizem que minto;
Quantas vezes sou amigo
De quem não se importa comigo,
Quantas vezes sinto o travo amargo
Que me traz o pesado encardo,
Que mais não é que maldição,
De ser das sombras personificação,
Pois ninguém vê as sombras
Nem lhes dispensa compreensão;
Se não mostro o que sinto
É por estar certo do gozo
Que de tal adviria.
Nada significariam os sentimentos
Ou quaisquer intentos
Que não fossem os seus;
Dizem que nunca tive amigos,
Eu digo que tento tê-los
Mas ninguém mos quer dar;
Eu vejo o que eles não vêem
E eles o que eu não posso ver;
Não entendem o fantasma
Que atrás dele vai
Para os ajudar quando caem;
Não!, isso não vêem eles,
Que com sabres ao meu caminho saem.
Não sinto como eles sentem
Nem eles como eu sinto;
Dizem-me que não conheço afeição
Mas não me dão compreensão;
Juram que não é verdade
Quando digo que, ainda que só,
Sinto a Humanidade
E que na solidão ando, cansado,
A buscar o que me é negado;
Eles acham que não,
Mas dentro de mim
Também existe um coração.
Só com eles concordo numa coisa:
Minha solidão não irá acabar
Se tudo assim continuar -
- Pelo menos não antes
De a vida se me findar.
Espero estar enganado.
Quem me desenganará?
Não sei, mas pressinto que virá.


Conhecimento
Ancestral conhecimento guia o mundo
E todas as criaturas desse reino fecundo
Que limites não conhece
E nunca em sombras desaparece
E que dentro de nós pulsa e permanece.
Guia os meus passos incertos,
Ilumina-me os olhos abertos
Com de emoções um manancial
Que tem tanto de belo como de irreal.
De lá fluem altos e puros pensamentos
Em nada parecidos com essa razão fria
A que se chama inteligência;
É sim uma atordoante alegria,
Douta e ignorante sapiência
Que me alegra em todos os momentos.
E é com esta douta erudição
Que desvendo dos meus pares
Os segredos do coração
Que nos movem a intenção
Como a suave lua move os mares.
É um conhecimento que não se pode aprisionar
Apenas se pode almejar e talvez alcançar,
Mas pelo qual temos de lutar.
Impera desde o abismo profundo
Às altas abóbadas do céu rotundo.
É um segredo transmitido por um olhar
Que, em silencioso conversar
De conversas emotivas,
O não pode nem quer ocultar.
T.F.

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