28/09/11

A Nossa Biblioteca em POESIA


A nossa biblioteca é um lar acolhedor, um lugar especial - isso é inegável. Muitas vezes, quando uma coisa se torna rotineira, quando o entra-e-sai se torna um lugar-comum, quando nos habituamos de tal modo a um espaço com o qual convivemos diariamente, podemos deixar de reparar, a pouco e pouco, nas coisas que o tornam especial...é como se deixássemos de ter os olhos abertos. 

É, também, certo que quem anda com os olhos fechados acaba por tropeçar e cair. É de um bom abanão que todos precisamos, de vez em quando. O poema que se segue, é um maravilhoso abanão a este particular tipo de cegueira. Foi escrito pelo professor de Filosofia e poeta Joaquim Nogueira Marques, o qual já participou em numerosos colóquios com os alunos da nossa escola. Quando solicitado a escrever um texto para figurar entre os primeiros a terem lugar neste blogue, o professor escreveu, respondendo:

"Tudo o que eu sei dizer sobre esse lugar transcendente que é uma Biblioteca está no meu poema com esse título, que anexo e que podem publicar, se acharem interessante - ele foi feito precisamente para a inauguração  da Biblioteca da minha escola, há uns anos, mas vai dedicado a toda a vossa equipa, pois o espírito cultural e humano é o mesmo.
Se preferirem um texto de outra ordem, tentarei fazê-lo com todo o gosto, mas sendo a minha amistosa ligação à vossa escola e biblioteca na qualidade de poeta, acho que o poema ficaria bem (...)"

Como filósofo que é, o professor Joaquim Marques consegue, com este poema, um dos maiores feitos ao alcance de um filósofo: impedir que os seus leitores deixem de se espantar com o que vêem. O espanto advém de se ver realmente e leva ao verdadeiro entendimento do que se vê...e, através deste poema, podemos olhar, ver e espantar-nos com o deslumbrante alcance do potencial de uma biblioteca - em especial, digo-o honestamente, da nossa biblioteca. Convidamos, pois, os leitores deste blog a saborearem calmamente este banquete poético...


 

"Biblioteca"

Dedicado a todos os meus amigos que fazem da Biblioteca da Escola EB 2+3 de Telheiras nº1 um lugar de saberes e de humanidade.

Ao entrar na biblioteca
o homem respirou fundo
o silêncio branco
com que as paredes tinham sido pintadas
Abriu um livro como quem abre uma cortina
e já debruçado
no parapeito de uma página
teve que cerrar um pouco os olhos
para se resguardar da luz
que nela estava poisada
Era uma luz  suave
que falava da vida e da morte
do amor e do ódio
do espanto e da memória
A luz  foi transbordando
e espalhou-se líquida
pela mesa onde o homem estava sentado

O tempo que por ali passava
suspendeu a urgência
dos seus passos incontornáveis
Sentou-se ao lado do homem
e deixou-se ficar
ausente
preso pelo relato
de um mundo inventado em cada letra
rendado em cada palavra

Assim ficaram o homem e o tempo
até que algumas estrelas
que moravam nos livros
agora adormecidos resolveram ir passear no céu

Antes de sair
o homem olhou para trás
e feliz
respirou outra vez
o silêncio branco
eterno das paredes
- Amanhã aqui voltarei
a este lugar onde os homens se tornam deuses !  

Joaquim Nogueira Marques

*

Em Jeito de Exortação...

"As palavras que se seguem são de Rita Vilela, autora de As 7 Cores de Oníris e de muitos outros livros, que muito amavelmente acedeu escrever um prefácio a este blogue, com o que muito nos honrou. Como acontece com todos os seus textos, este é uma fonte de deleite, pois Rita Vilela é, de facto, mestre na arte das palavras e, até com este breve texto, transforma a leitura, a suprema aventura, numa fonte de magia. Não cremos que seja possível terminar de ler esta espantosa exortação, este chamamento ao sonho, sem nos sentirmos revigorados e inspirados! Ora leiam..." [Tomás Vicente, introdução ao texto de Rita Vilela em Palavras a Solta na Net]

                                                                                     Ilustradora  Jeannette Woitzik

Há um lugar muito especial, um lugar único, onde tudo pode acontecer, onde podes ser quem tu quiseres… um lugar que gostamos de visitar.

No início é muito fácil chegar lá, e ficas horas e horas sem vontade de regressar. Depois, muitos são os obstáculos que te impedem lá ir… e podes mesmo começar a esquecer-te do caminho.

E então, um dia, descobres que há livros que te conduzem até lá. Não são todos os livros… não são os mesmos para todas as pessoas… terás de descobrir aqueles que funcionam no teu caso. Mas, uma coisa te garanto, vale a pena procurá-los… Consta que aqueles que os encontram, nunca mais deixam de ler.

Em seguida, com sorte, talvez descubras que uma folha em branco também consegue criar magia… quando a começas a preencher, por brincadeira, sem te preocupares com o que vai sair. Uma folha em branco pode ser um acesso fabuloso a esse lugar especial.

E, se continuares a preencher folhas em branco com prazer, um dia percebes que algumas das palavras que escreveste conduziram outros, mostraram-lhes o caminho para lá chegar… e essa é a melhor recompensa que podes ter (como escritor/a).
Comigo, foi assim! Espero que convosco também possa ser J

Que encontrem os livros que vos fazem sonhar… que sonhem através da escrita… que ajudem outros a encontrar o caminho do sonho.

Rita Vilela


Aqui estão dois links que podem ajudar a conhecer melhor o trabalho desta escritora...

Sequência poética 4

Tempo, o Carcereiro
Coisa estranha, não será,
Que o tempo, o dolente tempo,
Faça, à passagem, prisioneiras?
Mas – assombro! – leva consigo
Todas as coisas verdadeiras,
O mundo onde vivo;
E, diante de mim,
Apaga o caminho que ainda sigo.
Ó tempo, impiedoso és,
Por não te contentares
Em levar, para teu prazer,
As coisas derradeiras,
Rios, lagos, cabeços e pomares,
Quando delas fica o mundo vazio;
Levas-nos ainda o ano velho e sábio,
Deixando para trás o novo em desafio.
E, porque isto não te chega,
Voltas e levas o formoso Estio,
Atrás do qual fica o Inverno frio;
Mas cruel é a vida e tu guloso:
Despidos de todos os adornos,
Parcos na posse de outras belezas
Nos encontras, mas ainda mais riquezas
Nos tiras, pois cativas

Levas as nossas memórias vivas.


Lágrimas de Fénix
Quem chorar nunca soube -
Mas chorar verdadeiras lágrimas sentidas! -,
Não sabe o que é como uma fénix chorar
Não conhece a verdadeira tristeza,
Não sabe o que é lamentar
Ou de algo sentir pena.
Já chorei como uma fénix,
Desolada e inconsolavelmente,
E para mim nesse dia o mundo acabou
E por artes mágicas não renasceu
E nunca isso verei acontecer.
Tal como a dourada ave brilhante,
Eu chorei por algo amado ter que abandonar.
Se era pessoa, sonho ou lugar
Isso já não posso afirmar,
Pois cada um destes
Dolorosos casos já aconteceu.
Se custoso é ir em viagem
E para trás ficar alguém que durante muito
Tempo não poderemos ver,
Custoso é também mão abrir
Dum mundo de sonhos e fantasias
Onde a vida alegre parece voar
E onde os dias, sejam de sol ou chuva,
Levados são a rir e a alegria se faz ouvir!
Muito dói também perder um sonho,
Que com o lugar da sua criação se afunda!
Eis a minha missão nesta vida:
Pelas pessoas sempre zelar
E ao longo do tempo com primor cuidar
Que nunca o sonho se afunde,
Que nunca o longínquo ou impossível
De ser sonhado deixe
Não ser também como triste peixe
Que guelras ganha tristemente
Enquanto se afunda o seu mundo de sonho
Para o Abismo arrastado impiedosamente.
Eis o que devo fazer para cumprir
Tal missão, digna de se fazer ouvir:
Em viagem grande devo partir
Sempre comigo levando
Quem não quero eu que para trás fique1
Para o sonho não perder
Comigo tenho sempre de o ter,
De sonhar o improvável é meu dever
E a palavra » impossível « combater.
Nunca o meu de sonhos o meu mundo
Impiedosamente sugado irá ao fundo,
Que flutuadores eu arranjarei
Para garantir que um mundo melhor que o meu
Não se vá embora para o mar escuro como breu.
Há muito que choro como as fénixes,
Por um lugar que era meu
E que me tirou do Destino negro camafeu!
Choro lágrimas sentidas
Pois falhado tenho na minha missão
E os flutuadores rebentados estão,
Mas da batalha ainda não fugi,
Que me move mais forte nostalgia
Que aquela que alguma vez senti.
Exprimir tenho o que senti,
Pois que tal emoção se desvaneça não quero,
Apesar de há algum tempo
Se ter suavizado, não sendo por isso
Menos puras ou verdadeiras,
Pois não se tornaram de emoções mestiço.
É triste isto dizer,
Mas só agora pude tudo isto contar,
Que tinha o peito tão cheio d’ emoções
Que já nem podia comer!
Vou pois contar tudo isto
Que por dentro me aflige
E que de minha alma tanta força exije!
Choro eu por um lugar amado
Onde já não serei retornado.
Era o meu lugar de sonhos e divagações,
Por mundos fantásticos entusiasmantes incursões.
Era um mundo pelo luar banhado,
Detentor de uma magia linda e fria,
Era detentor de dias serenos de sol preenchidos
Que fatal atracção em mim exercia
Tinha de chuva, nevoeiro e cinza pálido
Muitos dias especiais,
Onde não havia dois iguais!
Para mim o mais belo lugar da terra
Está pois agora vedado,
Pois apesar de lá poder voltar,
Em tardes de deliciosa saudade,
Nunca mais me permitirão lá morar.
Mas apesar de o corpo por algures errar,
Minha alma já fixo tem um lar!
É por isso que estou a chorar,
A prantear como uma fénix que arde,
Pois como divido pode estar
Um ser humano que sonha
Mas também anda, e cujo corpo
A alma perdeu para sítio inalcançável.
E mais doloroso é ainda
Que a alma seja do reino mágico habitante
Sem para lá poder levar o corpo que errante!
Choro como uma fénix,
Pois a minha alma está a morar
Num lugar que foi lavado
Para o negro fundo do mar!


No Deserto Gelado
O deserto é grande e gelado,
De disforme aridez;
Assombrado.
A minha vós ecoa no vazio,
Reverbera no vácuo e retumba na mente;
Não há água, não há vento;
Não vejo frutos nem folhas.
Tudo mirrou, perdeu a cor.
Onde a fecunda terra?
Onde o doce orvalho?
Onde as árvores e os pássaros?
Onde a alegria
De um riso meigo e sincero?
Onde um ombro amigo?
Para onde foi a vida?
Ou, se agora vivo e antes sonhava,
Para onde o sonho?
A mente sem descanso o procura,
Uma efémera imitação
Do salutar passado;
Mas nada há no deserto
Que não sejam partidas do destino,
O negro fado, que aqui me trouxe.
O deserto é terra de engano,
Onde só há dor e incerteza,
Onde a vida e a força se apagam
Numa mórbida moleza.
Só a voz do deserto me responde,
Zombando de mim.
Mas de onde vem ela, se tudo murchou?
Os pesadelos acoitam-se-me na alma
E aí traçam o destino
Da minha tortura.
Parece que, em lugar da fartura,
Só ficou a negridão;
Já tudo é loucura,
Já nada é são;
E se estes versos
De desespero não rimam,
É culpa da áspera secura
Da tinta que me tinge a alma
E do cruel fado que me deixou
Nas ruas da amargura.
Tomás Vicente (ex-aluno)

27/09/11

As Nossas Verdades


Tive o grato prazer de receber o convite de um ex-aluno da Escola EB 2.3 de Telheiras nr.1 (ele frequenta agora o 11º ano mas continua a ser fiel a este espaço colaborando com a nossa BE), para escrever o texto inauguratório do blog Palavras à Solta. Não soube ou não quis eu recusar o convite. O Tomás, que acompanhei desde o seu 6º ano de escolaridade, mostrou-se sempre um aluno cumpridor dos seus deveres, amigo do seu amigo, íntegro, completo. Como poderia então a professora de Português, reconhecendo todas estas qualidades no seu ex-discente, recusar semelhante convite?
Aceitei portanto o desafio. Contudo, passados os primeiros momentos, interroguei-me: mas que vou eu dizer nesse texto, um texto para um blog, eu, que sou apenas uma auto-ditada em matéria informática?...
O Tomás disse-me depois que o tema era livre (embora o blog se destine a receber textos recreativos) e fiquei mais tranquila…
Então, remexendo na «minha caixinha de recordações», dei comigo a pensar em Leonardo da Vinci, uma das figuras mais importantes do Alto Renascimento (sécs. XV e XVI), e lembrei-me de uma frase cuja autoria lhe é atribuída:

«Aprender é a única coisa de que a mente nunca se cansa, nunca tem medo e nunca se arrepende»

Da Vinci, que se destacou nas mais diversas áreas, nomeadamente como cientista, botânico, matemático, anatomista, engenheiro, arquitecto, escultor, poeta, músico, pintor, e é também referenciado como o precursor da aviação, é um exemplo poderoso da frase que ele próprio criou.

A sua personalidade e a sua mente parecem sobrenaturais para os homens comuns, simples mortais. A multiplicidade dos dons de Leonardo da Vinci, as suas capacidades e aptidões tecnológicas permitiram-lhe conceber ideias muito para além do seu tempo, como, por exemplo, «um protótipo de helicóptero, um tanque de guerra ou uma calculadora». Perante a riqueza imensa do seu curriculum, parece-me óbvio que da Vinci foi um verdadeiro polimata, alguém cujo conhecimento não se restringe a uma única área, alguém que é detentor, de facto, de um conhecimento profundo e que, parece-me também lógico, podia ter sido um precursor, um dos criadores/inventores do espaço cibernauta. Espaço esse que é imprescindível para uns, muitos, mas também ainda ignorado por outros, muitos também, nos tempos tão atribulados que hoje vivemos, e que vos permite, a vós, fazer a leitura deste texto redigido de forma absolutamente singela, franca e despretensiosa.
A redacção de qualquer texto tem que ser uma tarefa que exija respeito para com as nossas verdades, que podem, naturalmente, não ser absolutas, mas que devem conter e apresentar a sagesse necessária usando de palavras certas, no momento certo.
Os princípios básicos do humanismo renascentista defendiam que "um homem podia fazer todas as coisas que quisesse ", assim, e considerando também que vivemos num mundo que continua em profunda mutação, decidi que, num ápice, atravessaria séculos de História para chegar aos dias de hoje relembrando um vulto da literatura portuguesa. Termino esta breve reflexão com um extraordinário, actual e significativo poema de Pessoa:

Posso ter defeitos, viver ansioso e ficar algumas vezes irritado,

Mas não esqueço que a minha vida é a maior empresa do mundo.
E posso evitar que ela vá à falência.

Ser feliz é reconhecer que vale a pena viver,

Apesar de todos os desafios, incompreensões e períodos de crise.

Ser feliz é deixar de ser vítima dos problemas e tornar-se autor da própria história.

É atravessar desertos fora de si, mas ser capaz de encontrar um oásis  no recôndito da sua alma.

É agradecer a Deus em cada manhã pelo milagre da vida.

Ser feliz é não ter medo dos próprios sentimentos.

É saber falar de si mesmo. É ter coragem para ouvir um “não”.

É ter segurança para receber uma crítica, mesmo que injusta.

Pedras no caminho? Guardo-as todas, um dia vou construir um castelo…

                                                           Professora Clotilde Mota


Nota: Este texto foi escrito como prefácio ao blogue criado pelo nosso ex-aluno Tomás Vicente, Palavras à Solta na Net, que teve como objectivo servir de suporte a informações adicionais relacionadas com as BE do nosso agrupamento que complementassem as que aqui são divulgadas. Mas o tempo prega-nos partidas grandes e o autor do mencionado blogue não pode continuar a geri-lo, pelo que este será brevemente encerrado. Assim sendo, optou-se por reintegrar aqui (com a data da publicação original) todas as mensagens cujo conteúdo fosse directamente relacionado com a nossa BE e pela reprodução dos comentários que as mesmas tivessem eventualmente recebido no blogue de origem - lamentamos, mas não há nenhuma ferramenta que permita manipular a data dos comentários, pelo que estes terão de aparecer com a data da transposição. Para orientação dos nossos leitores, outras mensagens reintegradas estarão marcadas com um pequeno asterisco no fundo da página.
A Equipa da BE, 14 de Fevereiro de 2013

24/09/11

Sequência poética 3

Escravo da Lua
A lua surgiu por detrás das montanhas…
E com ela,
O Lobisomem que há em mim…
Ergui a cabeça para o luar,
Com um uivo arrepiante,
Pois à minha garganta sequiosa
Não molestava o vento cortante.
O vento mudou e com ele trouxe um odor…
Loucamente rumei, sem sentir qualquer dor.
Enveredei pela estrada, rodeada de abetos.
Negro, um vulto agitou-se na berma,
De um salto o derrubei
E a garganta lhe rasguei.
Não era minha intenção, mas a lua mudou
E a minha natureza imperou
Do sangue provei
E condenado fiquei.
Para sempre

Um escravo da Lua!


Escravo do Sol
A luz ofuscante também cansa,
Fere os olhos e a alma
E anseio por me recolher
À sombra dos densos bosques
Onde é sempre madrugada azul,
Onde a luz amarela não entra;
Preciso do carinho da noite e da lua.
No entanto, nem sempre
Se pode escapar ao amarelo círculo
E, onde estou, não me posso esconder
Dos seus raios furiosos e abrasadores,
Da seca universal que me rodeia.
Estou escravizado e não sei fugir.
Resta-me sonhar com o embalo
Suave e doce das estrelas lá no alto,
O afago suave da lua
E as carícias do doce vento fresco,
Pois estou num país que nada mais que sol
E furioso calor tem para me dar,
Numa terra onde só vejo deserto.


Não Preciso de Lamentos!
Não preciso de lamentos
Nem de pena ou piedade;
Não quero desespero alheio,
Pois me já basta o meu.
Não preciso de desistentes
Que me digam a cada hora
Que também devo desistir.
Não preciso de carpideiras.
Preciso de coragem e apoio,
De um fiel ombro amigo;
Preciso de quem chore comigo
E de quem se aventure na minha empresa.
Não preciso que me digam
Que são poucas as hipóteses
De ser bem sucedido;
Não preciso de quem se acobarde.
Preciso sim de carinho e amizade
E espero por quem ma dará,
Mas o ombro amigo
Não está cá nem sei se voltará.


Não Fui Esquecido
O Sol amanhecia ansiosamente,
Do Leste vindo a suspeita
De que o dia não vinha completo,
Pela omissão do que devia ser dito…
E, quando o dever não foi cumprido,
Que tranquilidade pode o dia
Trazer a quem já a tinha perdido?
Mas, quando a oportunidade
Foi já no curso do tempo levada
Juntamente com aquilo
De que sinto já a saudade
E a esperança tende a ser perdida,
Toca o telefone, barulhento,
E no peito é sentida
A emoção de quem sabe
Que não tem a guerra perdida,
Pois, contra os intentos do olvido,
Se sabe agora que não se foi esquecido.


Páginas em Branco no Livro Aberto
No início, a página era branca,
De uma lisura amistosa,
Regular perfeição espantosa.
No entanto, com o tempo,
Um doce chamamento vai cantando,
Da sua nebulosa brancura,
E à página o conhecimento aflorando
Dos segredos acumulados
Nos anos que vão passando.
Vem na ponta de mágica caneta,
Que desliza, saltita e brinca
Ou fere como aguçada baioneta:
São as águas da represa
Despenhando-se no rio da vida;
Os açucarados contentamentos,
A superação do dia-a-dia,
Com travo a maravilhosas aventuras,
E, insuspeitas, as tristezas duras,
Que atacam do âmago do negrume
Com célere, certeiro e rutilante gume.
Agora o livro já vai longo
Mas a história nem a meio.
T.F.

23/09/11

Blogue de Escrita Criativa



O blogue de escrita criativa, cujo nome é "Palavras à Solta", já está a funcionar!!!!! Finalmente! E à vossa disposição. 

O endereço deste novo blogue é www.palavrasasoltananet.blogspot.com e esperamos que todos se divirtam muito a explorá-lo! Convidamos toda a comunidade escolar a participar neste projecto. Para isso, só é preciso entregar na BE uma cópia do trabalho, que reencaminharemos prontamente para o ex-aluno que criou este blogue. Lembramos, a pedido do gestor desse blogue, que estes podem, sempre que o remetente o desejar, ser publicados no dito blogue sob um pseudónimo.

Relembramos que o gestor do blogue reserva-se o direito de seleccionar os trabalhos que forem submetidos para publicação.

Desejamos a todos umas boas leituras e boa escrita!

19/09/11

Sequência poética 2

Não Há Tecto sob o Céu
Buscando a doce guarida
Anda o viajante toda a vida…
Debaixo do Sol ardente,
Sofrendo com a luz incandescente
Ou sob a pálida e falsa Lua,
Cuja bela luminosidade fria e crua
Esconde nas trevas terríveis
Da Natureza os perigos incríveis;
Sob a chuva da tormenta,
De compaixão isenta,
Ou sob as neves singulares
Que nos chegam dos glaciares;
Sempre caminha o caminhante,
Trilhando o percurso extenuante.
Assim, para sempre persiste

Na busca do tecto que não existe.


O Símio
Acordo com a imagem perturbante
De um pequeno ser arrepiante
Que vai aonde quer que eu vá
E faz tudo o que eu fizer.
Sinto-me incomodado…porque será?
Talvez porque o bicho me mostra
Tudo aquilo que não quis ver.
Continuo a andar, sigo o meu caminho
E lá vem atrás o bicho para me assombrar.
Farto-me dele, dou-lhe murros
Mas nem lhe consigo acertar…
Apetece-me que desapareça,
Pois nunca vi coisa que se pareça;
No entanto, sem mim ele não parte,
N em por força de toda a arte.
Seja bicho, seja homem,
Seja macaco ou verme que aves comem,
Não me larga nem se desvanece
Porque – espanto! – o bicho sou eu!


Amante do Tempo
Sou amante do tempo,
Mas ele já não gosta de mim;
Abandonou-me, deixou-me para trás,
E seguiu levando o que fui;
É cruel ser-se rejeitado
Quando a estrada
Atrás já vai longa
E se perde nas caudas da idade,
Lonjuras do destino,
Um tempo que, sem delonga,
Célere foge pelos prados saudosos.
Não sei porque me deixou…
Talvez por me ter descuidado,
Fechado os olhos;
Talvez por não lhe acompanhar
O implacável passo rápido
Com que percorre os caminhos.
O que é certo é que estou sozinho
E, o que é mais, vazio,
Pois, por capricho da sorte,
Parece-me que já não me lembro
Do que o tempo traquina
Ainda há pouco tempo me levou.


O Enfeitiçado
Ai, que prisioneiro era aquele,
Que vencedor tão derrotado!
Pelos caminhos andava agrilhoado,
Numa alegria louca e cega
E para ele não havia
Presente, futuro ou passado!
Havia apenas a sua cegueira,
Aquele momento fugidio
Que da vida mais não era que rasteira!
Vencera força maior que tudo,
Para si a conquistara,
Mas fora general imprudente,
Rei que a terra bem não governara,
E sujeito havia sido
À força que sujeitara.
Ai, que feiticeiro tão embruxado
Era aquele de quem falo,
Que feitiço lançara,
Por própria vontade,
Feitiço que o aprisionara
Para toda a eternidade!


Capacete de Hades
Quando nasci puseram-me na cabeça
O mágico capacete de Hades,
Por medo que o mundo, se me visse,
Mal cruel me fizesse.
Mas, quando mo quiseram tirar,
Viram que ele não saía,
Por isso ainda agora, anos volvidos,
Tenho de o suportar.
Mas, cruel capacete este é,
Pois protegeu-me isolando-me
Na sua invisibilidade protectora
E, por me achar assim isolado à nascença,
Não sei como quebrar a barreira,
Também ela invisível,
Do mundo onde pertenço.
E, como o capacete não saiu,
Estou invisível para todos,
E o mundo de mim não sente falta,
Pois não se pode desejar rever
O que nunca com a vista se alcançou.
Tento ajudar quem passa,
Mas ninguém sabe, por esse bem,
A quem agradecer.
Por mais que acompanhe as gentes,
Estou convencido de que nunca
Hão-de de elas olhar para o lado
E ver o amigo inesperado,
Porque não o viram
Nem precisam de o ver.
Tomás Vicente (ex-aluno)