19/09/11

Sequência poética 2

Não Há Tecto sob o Céu
Buscando a doce guarida
Anda o viajante toda a vida…
Debaixo do Sol ardente,
Sofrendo com a luz incandescente
Ou sob a pálida e falsa Lua,
Cuja bela luminosidade fria e crua
Esconde nas trevas terríveis
Da Natureza os perigos incríveis;
Sob a chuva da tormenta,
De compaixão isenta,
Ou sob as neves singulares
Que nos chegam dos glaciares;
Sempre caminha o caminhante,
Trilhando o percurso extenuante.
Assim, para sempre persiste

Na busca do tecto que não existe.


O Símio
Acordo com a imagem perturbante
De um pequeno ser arrepiante
Que vai aonde quer que eu vá
E faz tudo o que eu fizer.
Sinto-me incomodado…porque será?
Talvez porque o bicho me mostra
Tudo aquilo que não quis ver.
Continuo a andar, sigo o meu caminho
E lá vem atrás o bicho para me assombrar.
Farto-me dele, dou-lhe murros
Mas nem lhe consigo acertar…
Apetece-me que desapareça,
Pois nunca vi coisa que se pareça;
No entanto, sem mim ele não parte,
N em por força de toda a arte.
Seja bicho, seja homem,
Seja macaco ou verme que aves comem,
Não me larga nem se desvanece
Porque – espanto! – o bicho sou eu!


Amante do Tempo
Sou amante do tempo,
Mas ele já não gosta de mim;
Abandonou-me, deixou-me para trás,
E seguiu levando o que fui;
É cruel ser-se rejeitado
Quando a estrada
Atrás já vai longa
E se perde nas caudas da idade,
Lonjuras do destino,
Um tempo que, sem delonga,
Célere foge pelos prados saudosos.
Não sei porque me deixou…
Talvez por me ter descuidado,
Fechado os olhos;
Talvez por não lhe acompanhar
O implacável passo rápido
Com que percorre os caminhos.
O que é certo é que estou sozinho
E, o que é mais, vazio,
Pois, por capricho da sorte,
Parece-me que já não me lembro
Do que o tempo traquina
Ainda há pouco tempo me levou.


O Enfeitiçado
Ai, que prisioneiro era aquele,
Que vencedor tão derrotado!
Pelos caminhos andava agrilhoado,
Numa alegria louca e cega
E para ele não havia
Presente, futuro ou passado!
Havia apenas a sua cegueira,
Aquele momento fugidio
Que da vida mais não era que rasteira!
Vencera força maior que tudo,
Para si a conquistara,
Mas fora general imprudente,
Rei que a terra bem não governara,
E sujeito havia sido
À força que sujeitara.
Ai, que feiticeiro tão embruxado
Era aquele de quem falo,
Que feitiço lançara,
Por própria vontade,
Feitiço que o aprisionara
Para toda a eternidade!


Capacete de Hades
Quando nasci puseram-me na cabeça
O mágico capacete de Hades,
Por medo que o mundo, se me visse,
Mal cruel me fizesse.
Mas, quando mo quiseram tirar,
Viram que ele não saía,
Por isso ainda agora, anos volvidos,
Tenho de o suportar.
Mas, cruel capacete este é,
Pois protegeu-me isolando-me
Na sua invisibilidade protectora
E, por me achar assim isolado à nascença,
Não sei como quebrar a barreira,
Também ela invisível,
Do mundo onde pertenço.
E, como o capacete não saiu,
Estou invisível para todos,
E o mundo de mim não sente falta,
Pois não se pode desejar rever
O que nunca com a vista se alcançou.
Tento ajudar quem passa,
Mas ninguém sabe, por esse bem,
A quem agradecer.
Por mais que acompanhe as gentes,
Estou convencido de que nunca
Hão-de de elas olhar para o lado
E ver o amigo inesperado,
Porque não o viram
Nem precisam de o ver.
Tomás Vicente (ex-aluno)


Sem comentários:

Enviar um comentário