01/08/13

Residuais do Blogue "Palavras à Solta" - 5

Aqui republicamos os poemas escritos por alguns nossos antigos alunos acerca da entrada em vigor do Acordo Ortográfico de 1990, como seguimento à fina ironia crítica do professor Joaquim Marques.

I

A Língua Mutilada

A minha pobre Língua
Está a ser duramente atacada,
Sem dó nem piedade.
Mutilada.

Ó Língua Portuguesa,
Coitada de ti,
Que és ferida por muitos gumes.
Coitados os que te prezam,
Pois sentem-se fervilhar
De angústia e raiva!
Ultraje!

Quem são os inimigos nesta guerra?
Isso não sei ao certo, não o posso dizer.
Apenas sei que são muitos,
São néscios e matreiros,
Deslizam nas sombras da ignorância
E acoitam-se nas trevas impenetráveis
À espera da tua noite,
Que rápida chega.

Como pôde isto acontecer?
Isso é mistério maior
Que a minha arte de adivinhar,
Pois ainda hoje estou para saber
Como conseguiu o Acordo triunfar.

Onde já se viu isto?
A nossa nobre língua transformada
Num monte de ortográfico lixo
E para sempre à calinada condenada!?

E que fiquem sabendo
Que o “p” e o “c” nunca hei-de separar!
E outros erros vergonhosos
Não irei, silencioso, aceitar.
E, se o meu grito de guerra
Não chegar aos ouvidos certos,
Que fique, ao menos, rouco de tanto gritar!


Com essas e outras palermices
Não hei-de eu concordar
E, como disse o esperto Aleixo,
A razão, mesmo vencida,
Não deixa de ser Razão!
 Ricardo Valente


II

Perguntem ao Verbo!

Mentem aqueles que dizem
Que estranhas deformações
Infligidas ao nosso Português
Não são mais que necessárias correcções;

Gostava de saber onde vai isto parar
Se a sério tomam todo o indivíduo
Que sua teoria não sabe fundamentar
Nem aquilo que já existe aceitar.

Gostava de saber onde vai isto parar
Se já por verdade da língua se toma
Aquilo que alguém inventa
Em obscuras horas ociosas.

Já não sei o que mais pode piorar
Se deixamos disseminar
Incoerentes ideias
De pessoas que se perdem nas próprias teias
E que nem ao verbo sabem perguntar
O que a seguir hão-de colocar!
 Ricardo Valente








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