05/04/11

Poesia à Solta

As Palavras
São como um cristal,
as palavras.
Algumas, um punhal,
um incêndio.
Outras,
orvalho apenas.

Secretas vêm, cheias de memória.
Inseguras navegam
(...)
Desamparadas, inocentes,
leves.
Tecidas são de luz
e são a noite.
E mesmo pálidas
verdes paraísos lembram ainda.

Quem  as escuta? Quem 
as recolhe, assim,
cruéis, desfeitas,
nas suas conchas puras?

E de súbito desaba o silêncio.
                                                     (...)             Eugénio de Andrade
Na nossa Biblioteca, realizou-se uma sessão de poesia organizada pela professora Clotilde Mota. A turma anfitriã, o 8ºD  dinamizou a dita sessão com a leitura de várias poesias à turma convidada, o 6ºG, que veio em busca de diversão e das maravilhosas experiências proporcionadas por um tal evento, que é sempre, no melhor dos sentidos, único.

Nunca há duas sessões de poesia iguais...cada uma traz sempre coisas novas: a poesia é a expressão máxima, falada ou escrita, do coração e da alma, o mais perto que alguma vez estaremos de transmitir a totalidade das manifestações sensíveis que levam a que reparemos nas coisas com os olhos de quem vê realmente, de quem não se limita a ver o tangível mas passa para além da barreira do que só se pode ver sentindo, um mundo por explorar e ao qual só podemos pertencer verdadeiramente depois de darmos esse salto magnífico a que se chama poesia, a poesia do espírito. E esta sessão foi uma das melhores.

Em cima de uma mesa repousavam vários livros de poesia, Luís de Camões, Cesário Verde, Fernando Pessoa e, claro, Joaquim Marques...a vivência do sentir de vários séculos em que as mesma coisas e a mesma essência de ser-se humano e falível, a certeza de que há algo mais para além de nós, uma maravilhosa aventura que leva à descoberta e, em muitos casos, maneiras diferentes de sentir a mesma coisa, uma vez que cada um de nós vê o mundo com os seus próprios olhos e não com os de outrem, que são, por isso, diferentes e nos fornecem, individualmente, uma perspectiva que vai ser a nossa, a nossa maneira de estar perante o mundo e perante os outros, detentores de uma realidade paralela e magnificamente desconhecida e inalcançável.

A poesia é um veículo de transmissão dessa outra maneira de ver tudo o que é próprio do ser humano, com todas as suas complexidades e perplexidades e, por sua vez, as sessões de poesia constituem um intercâmbio entre espíritos do passado e do presente e é isto que as torna tão especiais: um poema é um batimento do coração que o escreveu, por isso, a leitura de poemas e a sua análise e compreensão são um passo na direcção do entendimento do outro, um acto que nos torna completos por si só, ao abrir o nosso intelecto de modo a recebermos o melhor dos outros. Assim, uma sessão de poesia é sempre algo muito belo.

Logo no início da sessão, a professora Filipa leu o poema "A Biblioteca", de Joaquim Marques, um "hino" que reflecte bem a aquilo que a nossa Biblioteca preserva e representa, assim como todas as outras, aquilo que temos de tomar por divisa ao longo da vida e por que todos temos a obrigação de batalhar. Seguidamente, a professora Clotilde Mota leu o poema "As Palavras", de Eugénio de Andrade, que nos demonstra, de modo instantâneo e flamejante, o poder da palavra, que pode ser o passo decisivo na construção de algo melhor ou uma arma mais destrutiva que um tornado. Seguidamente leu um texto que eu próprio escrevi, chamado "A Morte Morreu de Medo", uma mistura de verso e prosa. No momento seguinte, depois de lidos mais alguns poemas e segmentos textuais, todos da autoria de escritores portugueses, vários alunos da turma do oitavo ano leram poesia aos seus colegas do quinto, dando-lhes a conhecer exemplos da beleza daquilo que o sonho de um ser humano consegue almejar e reter.

Foi, sem dúvida, uma experiência fantástica para todos os que nela participaram, um evento a saborear devidamente e a repetir sempre que possível, porque o termo de uma tal reunião se identifica com os versos finais do poema de Eugénio de Andrade uma vez que, estando todos nós envolvidos na poesia característica da própria sessão, de súbito desaba o silêncio. 
Tomás Vicente (ex-aluno)

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