01/04/11

Saramago, um amigo de livros



"Penso que estamos cegos, cegos que vêem, cegos que, vendo, não vêem."

José de Sousa Saramago foi o único escritor português a ganhar o Prémio Nobel da Literatura e a frase transcrita ilustra bem o merecimento e a qualidade do pensamento deste grande português, que faleceu a 18 de Junho de 2010, em Lanzarote. Esta frase, independentemente do sentido que o seu autor tivesse em mente, tem inúmeras aplicações, uma das quais diz respeito ao livro, que temos o ensejo de celebrar no contexto da passada Semana da Leitura e do Dia Internacional do Livro Infantil

Pode parecer monocórdico o facto de este blog tantas vezes ter necessidade de se debruçar sobre temas relacionados com a biblioteca e o livro, mas, se virmos bem, tais temas têm, na actualidade, uma influência muito grande em todos os outros, uma vez que a palavra escrita é a base de tudo o que existe, é a certeza na presença de uma realidade, e tem sido menosprezada pelas sucessivas vagas de gerações mais novas, de há alguns anos para cá.

Diz-se que ler não está na moda, que ler é uma tarefa desinteressante, aborrecida e que há maneiras mais úteis de passar o tempo. No entanto, não se critica as Redes Sociais, nem os perigos a que a rede de informações a nível global expõe a população e assim por diante. E o pior de tudo é que aqueles que têm poder para contrariar a proliferação de tais ideias e mentalidades nada fazem para impedir o contágio desta "doença espiritual", escondendo-se, em vez disso, atrás de ocos sloganes que defendem a "evolução" por simples evolução, que consiste em corromper o que já está bem feito, o que não pode ser melhorado. 

Esquecemo-nos ainda, com frequência, que antes de criticarmos temos de conhecer e de nos darmos ao trabalho de entender o verdadeiro alcance daquilo que nos propomos criticar, ou seja, esquecemos que nada se faz sem conhecimento. E os livros podem-nos proporcionar momentos espantosos de descoberta e deliciosas horas de sã divagação. Esquecemos que há um património que não é nosso para que possamos decidir sobre a sua sobrevivência e extinção; os livros são um desses monumentos, que não são nossos, não pertencem ao nosso tempo, pertencem a todos os tempos e a nossa missão é fazê-los perdurar.

Assim, ao querermos simplificar o que não tem simplificação possível porque não pode nem deve ter, ao deixarmos abundar defensores da digitalização e ao tentarmos boicotar a leitura, estamos simplesmente a cometer um crime para com as gerações vindouras, um crime que não tem perdão.
Como podemos, então, guiar-nos no meio deste turbilhão ideológico e combater um inimigo que vem ganhando terreno, a estupidez? O fio condutor é este que mencionei, defender o património que nos é "emprestado" temporariamente para que o possamos legar ao rendeiro seguinte em completa integridade.

Este princípio aparece, penso eu, como uma luz ao fundo de um túnel escuro. São os livros que nos iluminam o caminho, como um ideal em si próprios e uma filosofia de vida, dando-nos a luz necessária para atravessar o túnel, um túnel onde continuamente nos perdemos porque estamos cegos, cegos que vêem, cegos que, vendo, não vêem.  

Tomás Vicente (ex-aluno)

Sem comentários:

Enviar um comentário