17/05/14

Ulisses e Polifemo

[apresentamos abaixo uma adaptação teatral do episódio da Gruta de Polifemo, retirado do livro Ulisses, de Maria Alberta Menéres, feita pelo nosso ex-aluno Tomás Vicente]


Ulisses e Polifemo

Acto I
Ulisses e os seus marinheiros regressam a casa depois da guerra de Tróia, que demorou dez anos. Na viagem de regresso, são desviados da rota para Ítaca e chegam ao arquipélago da Ciclópia, onde vivem os ciclopes, filhos de Posídon. Passam ao largo de uma das ilhas e Ulisses dá ordens para que ancorem o navio. Os marinheiros estão aterrados pela ideia de monstros enormes com um só olho na testa mas Ulisses diz…

Cena I
Ulisses – Não tenhais medo! Eu conheço este arquipélago, pois já aqui passei ao largo antes! Esta é a única ilha em toda a Ciclópia que não é habitada!


Acto II
         Os marinheiros desembarcam e começam a explorar a ilha em busca de comida e de uma nascente de água doce. Ulisses ordena-lhes que tragam com eles um dos barris de vinho que têm a bordo, para o caso de pernoitarem em terra. Quando o sol atingiu o zénite, procuraram abrigo numa gruta e adormeceram. Só despertaram ao anoitecer e, quando se preparavam para correr de volta ao navio, foram apanhados de surpresa pela entrada de um grande rebanho e dum enorme ciclope. Este gigante chamava-se Polifemo e tinha sido mandado para ali pelos seus irmãos por causa do seu mau génio inigualável e da sua ferocidade, que assustava até os seus semelhantes.

Cena I

Marinheiros – (assustados) Um ciclope! Um ciclope!

Polifemo – (acordando) Homens! HOMENS! HOMENS! Arrggg…! (pega num pedregulho enorme de sela a entrada da gruta)

(Os marinheiros apavorados começam a correr em todas as direcções, enquanto o monstro os vai apanhando um a um e, num piscar de olhos, os faz desaparecer pela sua goela abaixo…tantos devorou que teve de sentar. Ulisses, sempre astuto, vendo-o mais calmo, acercou-se dele)

Ulisses – (fingindo admiração e reverência) Ó grande ciclope, não me comas! Tenho uma oferenda para te fazer.

Polifemo – Oferenda? Que é isso? Que me queres tu? Dize rápido, que não sou paciente!

Ulisses – Ó grande ciclope, depois de um banquete tão grande, com certeza estás com sede…

Polifemo – (interrompendo) Pois estou, mas se pensas que vos vou abrir a porta e vos deixo escapar, pensa melhor, que não me consegues enganar!

Ulisses – (obsequioso) Um homem não pode enganar os filhos de Posídon! O que eu quero fazer-te é uma oferenda! Tenho aqui um barril de vinho…é bebida cara e saborosa. Queres provar? Mas só to dou se me fizeres um favor.

Polifemo – (irritado) Ora, se quero provar! Está claro que quero provar! E que favor é esse?

Ulisses – Que nos deixes ir embora desta ilha.

Polifemo – (atirando um urro gutural que Ulisses percebeu ser riso) UAHAHAHAHAH! Ora essa, e ficar sem o meu pequeno-almoço? Isso é que não! Mas se me deres esse tal vinho e for bom, prometo que te faço um favor.

Ulisses – E que favor é esse?

Polifemo – Verás, mas primeiro o vinho. O VINHO, O VINHO, QUERO O VINHO JÁ!
(Ulisses ordena que lhe tragam o barril, que entrega a Polifemo. Este bebe todo o vinho de um só fôlego)

Polifemo – (limpando a boca com a mão e pestanejando) Ora esta, este tal vinho é bom, é! Ora, se é! Como recompensa, vais ser o último que eu vou comer.
(Polifemo foi-se mostrando muito mais amigável depois de ter bebido todo o vinho e acabou por contar a sua história a Ulisses. Em troca, exigiu saber o nome do navegador)

Polifemo – E tu, como te chamas? E como vieste cá parar?

Ulisses – (hesitando) Eu…

Polifemo – (erguendo um pouco a voz) Sim tu, como te chamas?

Ulisses – Eu…chamo-me…chamo-me…

Polifemo – (aos berros, irritado) SIM, TU! COMO TE CHAMAS? COMO TE CHAMAS? DIZ-ME JÁ!

Ulisses – Eu chamo-me Ninguém.

Polifemo – (soltando outra estrondosa gargalhada, ainda pior do que a anterior) UAHAHAHAHAHAHAHAHAHAHAH! Ninguém! Ahahahah! Ninguém! Que estranho nome te deram! Já percebo porque é que não o querias dizer! Ahahahahahahahahahahah
(A boa disposição de Polifemo voltou e ele estava prestes a exigir que lhe fosse contada a história dos viajantes quando o vinho fez finalmente efeito e ele adormeceu. Depois de verificarem se o gigante estava mesmo a dormir, os marinheiros reuniram-se para tentarem encontrar um modo de escapar. Não tinham força para mover o pedregulho…Ulisses decidiu então que o melhor a fazer era cegar o gigante. Apontou-lhe a espada mesmo para o centro do olho e ZÁS)

Polifemo – AUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUUU! (Polifemo acordou aos berros de dor, dando pulos tão grandes que quase parecia que a gruta viria a baixo) Acudam, meus irmão, acudam! Acudam ao pobre Polifemo!
(Os ciclopes acorreram aos seus gritos; mas tinham um grande medo àquele seu irmão violento, pelo que não se atreveram a retirar o pedregulho da gruta)

Ciclopes – Que foi, Polifemo?

Polifemo – (com urros chorosos) Acudam, Ninguém está aqui! Ninguém quer matar-me!

Ciclopes – (surpreendidos) Claro que não, Polifemo. Ninguém te quer matar nem ninguém está aí! Vai dormir Polifemo!

Polifemo – (com berros de frustração) Seus idiotas! Ninguém está aqui e quer matar-me!
(Mas os outros ciclopes, achando que ele estava a ter um dos seus ataques, foram-se embora e não lhe ligaram mais, tratando de se manter bem afastados da ilha dele. No dia seguinte, quando Polifemo abriu a entrada da gruta aos apalpões, Ulisses atou cada um dos homens à barriga de uma ovelha, pois o monstro tacteava o dorso de cada animal antes de o deixar passar, para se certificar de que não era nenhum humano. Os marinheiros lá foram saindo e, chegada a vez de Ulisses, este agarrou-se com força ao carneiro e lá foi. Mas Polifemo, que gostava muito do carneiro, demorou-o mais tempo e deu-lhe uma amigável palmada tão forte que Ulisses se desequilibrou, desatando a correr em seguida. Mas o gigante não o perseguiu, pois preferia perder um homem do que os outros todos que estavam dentro da gruta. Só quando percebeu que todos tinham fugido é que saiu a correr pela ilha, mas nessa altura já os marinheiros estavam a salvo, longe da ilha)


Coro – Ó astucioso Ulisses! Quantos perigos sofreste depois pelo que fizeste a Polifemo! Pois Posídon, o grande senhor dos mares, não perdoa com facilidade e não esqueceu o ataque ao seu filho ciclope! Na sua fúria, perseguiu-te ao longo de toda a viagem, enterrando nas profundezas o seu tridente para erguer contra ti as fúrias do mar!

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