19/02/13

A Despedida do Blogue "Palavras à Solta na Net"


“Escrever é traduzir. Mesmo quando estivermos a utilizar a nossa própria língua. Transportamos o que vemos e o que sentimos para um código convencional de signos, a escrita e deixamos às circunstâncias e aos acasos da comunicação a responsabilidade de fazer chegar à inteligência do leitor, não tanto a integridade da experiência que nos propusemos transmitir, mas uma sombra, ao menos, do que no fundo do nosso espírito sabemos bem ser intraduzível, por exemplo a emoção pura de um encontro, o deslumbramento de uma descoberta, esse instante fugaz de silêncio anterior à palavra que vai ficar na memória com o rasto de um sonho que o tempo não apagará por completo.”
José Saramago

Quando uma pessoa concebe e põe em prática um projecto, seja de que natureza for, nunca sabe onde este irá parar nem como será a chegada à meta. Muito menos pode ter a certeza de conseguir levá-lo a uma meta. Como diria um autor que muito aprecio, deitar os pés à estrada é uma coisa que tem os seus riscos, é uma aventura.

Este blogue, Palavras à Solta na Net, foi uma aventura. Uma boa aventura - para mim, pelo menos. Começou em Setembro de 2011, quando o objectivo criar um espaço onde os membros da comunidade escolar pudessem dar largas à sua imaginação através da escrita se tornou uma prioridade. Mas, uma vez mais, o homem pôs e a vida dispôs e as coisas não saíram exactamente como planeado. A abordagem teve de ser outra, bem como o modo de ligação à comunidade escolar mas, diria eu, os objectivos foram, pelo menos em parte, cumpridos, pois contei com a ajuda de colaboradores empenhados e, quanto mais não fosse, este blogue foi uma ferramenta adicional para proporcionar o contacto dos alunos com a leitura. Em variadas ocasiões, foi também um apoio ao blogue da Biblioteca Escolar da EB 2+3 de Telheiras nº1 e representou decentemente (tanto quanto sei) o seu papel. Por isso, admito que me sinto satisfeito com o trabalho realizado. (Será isto um sinal de vaidade? Ouso esperar que não). Agora, no entanto, cerca de um ano passado desde que a primeira mensagem foi publicada, novas mudanças se verificaram e uma nova adaptação é necessária...mas sobre isso falaremos mais à frente!

Creio que outra das linhas de força subjacentes a este blogue foi a procura da transmissão de bons valores através da palavra escrita e, uma vez que acho que se pode dizer que, de novo, essa linha de força esteve realmente presente e o papel foi bem representado, não consigo deixar de mencionar alguns aspectos relacionados com a mesma e de fazer um apelo.

Estamos numa fase sombria da nossa história, tornada negra pela aproximação final das nuvens negras que já há muito tempo se avolumavam no horizonte. Olhando à volta, vemos facilmente que muita coisa está errada, que a sociedade navega em maus valores, agravados, claro, pela crise - os comentadores vêem uma crise económica e financeira, mas eu atrevo-me a dizer que a mais importante e destrutiva crise é aquela que agora se nos depara no campo da moral. Diz-se "Não perguntes o que o teu país pode fazer por ti, mas sim o que tu podes fazer pelo teu país" e este é o lema pelo qual nos devíamos reger mas, em Portugal, essa frase traduz também um problema, uma vez que um país é uma mentalidade colectiva: como ajudar um país que não quer ser ajudado, que vive nas trevas e não quer ser guiado para a luz do sol, que deseja ficar esquecido, entre à mesquinhez duma austera, apagada e vil tristeza? Uma vez mais, apelo a que seja repensado o papel e a importância da palavra escrita na resolução de todas as crises, mas sobretudo no afastamento desta última, a mais negra das nuvens num céu já de si bem escuro. A palavra é a mais poderosa das armas; consegue ser destrutiva, enganar, dividir, enfraquecer, derrubar, mas a palavra em si é um instrumento do Bem, pode e deve ser utilizada com vista ao fim para que foi criar, pois é também uma ferramenta de cura, de união, de justiça e, acima de tudo, de verdade. Nenhuma bela mentira é melhor solução que a verdade, seja ela sombria ou luminosa. Assim, apelo para que, no seio da nossa comunidade escolar, se comece a estabelecer uma consciência colectiva de que, se algo tem que mudar para que tudo possa ficar como está, então a palavra é a principal força que nos pode levar nesse sentido, se aliada ao sentido de verdade, de justiça e de responsabilidade. 

Mas agora, (in)felizmente, o uso dessa ferramenta terá que ficar noutras mãos, no que a blogues diz respeito. O meu tempo como colaborador dos dois blogues das BE deste agrupamento trouxe-me a oportunidade de colaborar e contribuir regularmente para a efervescente atmosfera das escolas, onde fervem as ideias e as iniciativas - oxigénio de que se alimenta o espírito. Agora, no entanto, dadas condicionantes de foro pessoal e outras tarefas prementes com que me venho deparando nestes últimos tempos requerem a decisão que tenho vindo a adiar desde há alguns meses: o abrandamento (quase total) da actividade de blogger. Assim sendo, é apenas lógico que o blogue Palavras à Solta na Net seja retirado de circulação. O material nele incluído não será, no entanto, oliterado - antes será reintegrado no blogue da BE ou arquivado minuciosamente na colectânea Rato de Biblioteca, cujos quatro tomos estará brevemente à disposição na BE na sua totalidade.

Afastamento total é coisa de que não sou capaz, apesar da crescente necessidade de tempo, pelo que ouso esperar, assim, que se propicie uma colaboração esporádica que sacie os apetites da escrita e da leitura.
Muito obrigado a todos!

Tomás Vicente

"Uma escola não existe, faz-se e cresce connosco" - Lema da EB 2+3 de Telheiras nº1

Sem comentários:

Enviar um comentário