Ontem, terça-feira, dia 7 de Março, recebemos na nossa BE a professora Clotilde Mota, que deu aulas de Português e Francês na nossa escola durante oito anos, até 15 de Fevereiro último, altura em que recebeu a reforma, para uma conversa com duas das últimas turmas que acompanhou até essa data, o 7º3ª e o 8º2ª, encontro no qual estiveram presentes outros dois ilustres convidados: o professor Nelson Carvalho (antigo prof. de Português da nossa escola) e o professor Joaquim Marques, do qual já podemos dizer que é o nosso poeta, pela sua assiduidade em visitas à nossa escola e pela constante colaboração. Esta sessão foi motivada pelo desejo da Equipa da BE de homenagear uma docente extremamente competente cuja dedicação constante à causa da Língua Portuguesa e ao ensino da mesma, bem como à motivação dos alunos para a leitura e a descoberta das suas capacidades criativas através da escrita tem sido sempre um grande conforto para nós e será, certamente, uma fonte de inspiração para futuras gerações de alunos e professores. Ao nível da nossa biblioteca, queremos, ainda, agradecer à professora a sua constante colaboração com este espaço e esta Equipa na dinamização de eventos de promoção da literatura e da leitura, experiências enriquecedoras que, sem esta docente, não teriam sido possíveis. Neste dia tão especial, contámos ainda com uma exposição de alguns dos numerosos trabalhos de escrita criativa que a professora Clotilde desenvolveu com os alunos durante os seus largos anos de ensino, com especial destaque para os que foram elaborados nesta escola, entre 2006 e 2012.
Transcrevemos agora alguns excertos do texto introdutório escrito pelo ex-aluno Tomás Vicente, que foi aluno da professora Clotilde entre 2006 e 2010.
"Não creio
que haja alguma coisa perfeita neste mundo e nesta vida. Não faz mal. Se virmos
bem, a perfeição só é importante pelo facto de não existir, não é um conceito
ou estado a ser atingido, é um objectivo a ser perseguido ao longo de toda a
vida, uma disciplina para cingir a nossa existência.[...] Imaginemos um grupo de corredores que, numa prova, se esforçam por
alcançar a meta. Agora, imaginemos coisa insólita, imaginemos uma meta que, à medida que vamos galgando distância, se afasta de nós, repondo o espaço que
percorremos, sem, no entanto, desaparecer jamais do nosso campo de visão mas
também sem passar aquém da linha do horizonte. Nesta, como em qualquer outra
corrida, a meta só tem o significado do caminho que se percorreu; não se
triunfa na meta, triunfa-se na jornada até à mesma [...].
Vivendo
nós num mundo em que se tem generalizado a ideia de que o resultado é que conta
e se tem vindo a perder a noção de que o percurso é que conta e que é o modo
como chegamos ao patamar final que conta e nos define, é importante reiterar
que o primeiro papel da vida de cada um de nós é, precisamente, esse, o de
levar o ser à superação de si, orientada por um vector de disciplina e mérito
humano (em todas as suas vertentes) orientado em sentido ascensional. E é
muitíssimo importante que a ESCOLA continue a encarnar esta filosofia,
erguendo-se, como um edifício humano, dos valores que lhe servem de base.
Igualmente premente é que se perceba – que o percebamos todos nós, alunos,
professores funcionários e que seja essa a percepção fundamentada e a
expectativa de fora para dentro, da sociedade para o meio académico – que a
épica jornada do ensino-aprendizagem é uma viagem contínua direccionada para um
objectivo sempre mais alto e mais
longínquo. A meta, em consistência com o Dever, justificação e orientação
suprema de todas as coisas, não é, nem pode vir a ser, sem prejuízo para a
credibilidade dos valores que o ensino encarna, o fácil, o óbvio, o tangível. O
desafio que abraçamos com a aventura da educação é o da busca do vencimento de
obstáculos mais difíceis, da impetração feitos quiçá menos visíveis, mais
irreais, mas não menos verdadeiros, tendo em vista fins mais nobres,
conhecimentos mais vastos ou a conquista de mais laboriosos objectivos.
Aprender deve ser, sempre, como subir à Serra da Estrela com os olhos postos na
conquista do Everest [...].
É
urgente regenerar (ou preservar, nos casos em que tal possa ser feito)
mentalidades para que todos os envolvidos neste processo e todos aqueles que,
fora do meio escolar, desempenham papéis, mais ou menos importantes na formação
moral e intelectual de futuros seres humanos e cidadãos que se querem
conscientes, verdadeiros, revestidos de um profundo sentido de ética e do
dever, para que não seja nunca esquecido que a relação
ensino-aprendizagem-descoberta, possibilitando a experiência, dada à criatividade, ao desenvolvimento e à continuidade, é, em verdade, a luz do mundo e que a chave para um mundo
mais justo, mais nobre, mais ético parte deste contexto e dum esforço
concertado no sentido de pautar pela rectidão a mentalidade e formação dos
jovens, cuja natureza compreende inúmeras potencialidades, humanas e
intelectuais, que necessitam de ser guiadas [...].
[...] Acima
de tudo, é preciso que nós, alunos, entendamos, desde logo, que a escola fornece
conhecimentos, não nos dá, nem pode dar, o elixir do sucesso; dá-nos, isso sim,
a possibilidade de desenvolvermos as capacidades que nos permitirão, à custa de
esforço e dedicação constantes, construir o nosso futuro e abrir a porta para o
eventual sucesso [...]. A aprendizagem
é, de certo modo, a descodificação do mapa encriptado que nos leva até essa
porta: ninguém nos diz onde ela está, nem o que nos aguarda do outro lado; recebemos, somente, as ferramentas para a encontrarmos e rodarmos a chave para o lado
certo na fechadura ou, pelo menos, para encontrarmos o nosso norte, o nosso
lugar no mundo. A escola não é, nem pode ser, o fornecedor de respostas rápidas
e fáceis para questões complexas. [...] Este processo de crescimento, mais do que destinado a
prover-nos de soluções, tem como finalidade ensinar-nos a fazer perguntas. As
respostas trar-no-las-á a vida, quando devolver o eco das nossas perguntas.
Todos
nós temos necessidade de orientação enquanto percorremos este trajecto [...] e [...] de ter por perto alguém idóneo a quem
possamos recorrer quando não soubermos
que pergunta fazer. Essa é a essência do trabalho do professor – ser o
transmissor de conhecimentos, sim, mas, acima de tudo, motivar, guiar,
orientar, levar os formandos a questionarem-se a si mesmos e a tudo o que os
rodeia. O professor tem uma profissão árdua, mas nunca árida. Por muitos graus
académicos que detenha, por mais vasta que seja a sua erudição (e muito
necessário é que o seja), o professor acaba por nascer aos poucos na escola,
através do contacto directo com os seus alunos [...].
A
docência é, em si mesma, um género de sacerdócio, mas um sacerdócio especial
cuja substância abstracta se materializa nos efeitos que catalisa e em que o
sublime deixa de ser intangível, passando a poder ser tocado, mesmo se apenas
levemente, em ambiente de sala de aula. Há, também, uma disciplina moral
intrínseca desta relação simbiótica entre formador e formandos que, creio bem,
é o catalisador da primavera do que de melhor há no espírito humano [...]. O amadurecimento faz-se ao longo
da escola e da escola da vida, tal como se vai aperfeiçoando o sacerdócio do
ensino que o orienta, na demanda por aquela fugidia linha de horizonte em que o
real e o ideal se confundem, uma demanda que é o cinzel da nossa existência.
Hoje,
reunimo-nos aqui para receber a professora Clotilde Mota. Viemos aqui ouvir, beber
da sabedoria de um membro da nossa comunidade escolar que sempre se destacou
pela sua contínua e perseverante busca de excelência e em quem – creio que falo
por todos nós – pensamos já com saudade e por quem sentimos um profundo apreço
e respeito que lhe é devido pelo seu longo contributo e pela incansável
dedicação. Se é verdade, como eu creio que seja, que um dos piores males que
afligem a nossa sociedade é não nos ouvirmos uns aos outros, então, não
pequemos mais por isto e ouçamos agora, não como quem tira apontamentos para
debitar num teste, mas como quem veio – como espero que tenhamos todos vindo –
pela simples oportunidade de nos vermos enriquecidos moralmente pela partilha
de experiências de quem já nos deu tanto e certamente terá muito mais para nos
dar ainda, porque, como dizia Hipócrates, a arte é longa e a vida (ou o tempo,
neste caso) é breve.
Quis-se
que este encontro fosse também uma homenagem a esta nossa professora [...]. E, como a memória grata que de alguém guardamos é,
talvez, a melhor homenagem que podemos fazer a essa pessoa, lembremos pois – mas lembremos
sempre - uma pessoa que, tanto a nível profissional como a nível humano, primou
sempre pelo mérito, pela dedicação abnegada e pela humanidade da sua actuação.
Digamos também: bem-haja!
Tomás
Vicente Ferreira"
Depois de transcrevermos este texto emocionado, resta-nos dizer que a sessão, foi, obviamente, um momento sublime durante o qual fomos percorridos por uma sensação de realização, o tipo de sensação que gostaríamos que preenchesse todos os nossos dias! Obrigado, professora Clotilde, e obrigado também aos estimados convidados que puderam estar presentes nesta momento tão especial! Esperamos que, parafraseando o poema do professor Joaquim Marques, lembrando-nos de que há o regresso, as horas nos apontem a morada para um novo encontro, em que possamos de novo reunir-nos neste ambiente. Obrigado a todos!
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